O show de Moro – Um ano mágico na vida de um juiz de
província
Por Bajonas Teixeira, colunista de política do Cafezinho
O ano de 2016 no Brasil será recordado no futuro como o ano
em que brilhou a estrela do juiz Sérgio Moro. Impondo humilhações, afrontas e
desgastes à Lula e ao PT, Sérgio Moro viveu o ano mais feliz da sua vida
pública.
Ganhou honrarias, prêmios, menções, convites e encheu casas de show,
com ingressos pagos para suas aparições meteóricas. Tornou-se um astro muito
bem remunerado, dentro e fora do judiciário.
O alvo principal do show de Moro, ninguém ignora, é o
próprio Lula. É o ex-presidente Lula e tudo que está associado a ele: uma
imagem positiva do Brasil no exterior, o vislumbre de um país que desarmava o
ciclo das desigualdades, da fome, do analfabetismo.
Lula pregava a paz social.
Com Moro, ao contrário, o país se dividiu, o aumento da tensão provocada por
atos saídos da sua caneta, elevaram de tal modo a temperatura que, em diversos
momentos, temeu-se por uma guerra civil.
Moro é sem dúvida alguma o anti-Lula porque seu método não é
o de um pacificador, mas os de quem incita o conflito para gerar o combustível
de ódio que sua máquina precisa para funcionar. O temor, o medo, a insegurança
e o conflito são as suas alavancas.
Além do refluxo do orgulho de ser brasileiro, que caiu de
86% em 2014 para ridículos 34% em novembro de 2016, a exaltação dos ânimos
foi uma dos efeitos inconfundíveis do show de Moro.
Foi assim no dia 04 de
março, quando o show foi inaugurado, e Lula foi conduzido sob violência
policial (condução coercitiva) para depor no aeroporto de Congonhas, em São
Paulo.
Naquele distante 04 de março, como hoje, os objetivos de
Moro continuam os mesmos: prender Lula e liquidar sua imagem pública. A grande
humilhação que prepara para a figura de Lula, como símbolo da democracia
brasileira, será justamente prendê-lo, ou seja, colocar simbolicamente a
democracia brasileira fora da lei.
O que se chama de “ditadura judicial” não
pode ser outra coisa.
Nesse aspecto, o juiz Sérgio Moro lembra o humor
anti-politicamente correto da comédia stand-up brasileira. Assim, do mesmo modo
como um Danilo Gentili, depois de oferecer bananas para um negro encerrar uma
discussão, desrespeitou a senadora do PT, Regina Souza, que apelidou de “tia do
Café”, o juiz Sérgio Moro praticou um rosário de atos de evidente assédio moral
contra Lula.
Em essência, esses atos significam o seguinte: que os
abusos, os desrespeitos e as ilegalidades patentes, e muitas outras ninharias
do trato diário da Justiça brasileira para com os pobres, se voltou pela
primeira vez contra um ex-presidente da república duas vezes eleito.
E isso, de
fato, justamente por ser ele um representante dos pobres. A lógica dessa
justiça é muito simples. Ela diz: “Você não é o representante dos pobres, dos
periféricos e dos desvalidos? Então, meu amigo, prove do cálice que servimos a
eles todos os dias!”.
Tudo isso só pode ocorrer com uma enorme e patológica
conivência social e institucional. Não da classe média que foi às ruas. Essa
não é ninguém. É um mero fantoche político usando conforme a conveniência e a
ocasião. A cumplicidade decisiva para a ação de Moro foi a dos grandes
empresários, por um lado, e do STF e do Congresso, por outro.
Por exemplo. Após divulgar de forma criminosa as conversas
de Lula, Sérgio Moro pediu perdão (“respeitosas
escusas”) ao STF. Sim, é inacreditável, mas foi exatamente isso. Um juiz,
que deve se pautar pelo respeito estrito às leis, atua na forma da exceção, e,
depois, se desculpa. Mas não com a vítima. Se desculpa com a instituição cujo
dever é velar pela Constituição. E o que é pior: essa instituição o perdoa e
libera.
O show de Moro consiste justamente em episódios de abuso
explícito contra Lula que são aplaudidos pelo STF. É a comédia stand-up
judicial. Foi assim na condução coercitiva, foi assim na divulgação ilícita de
conversas ilegalmente gravadas, foi assim na aceitação das denúncias do MPF
inteiramente desprovidas de elementos probatórios sérios. Denúncias de
PowerPoint, que fizeram o país inteiro cair na gargalhada.
E tudo isso aconteceu num ano em que muito se falou de
“juizecos”, de “ditadura judicial”, de “abuso de poder por parte de
autoridades”. Um ano no qual, sobretudo, se falou de golpe.
Esse foi talvez o ano mais feliz, ano mágico, da vida do
juiz Sérgio Moro. Com ele, Curitiba deixou de ser província para se tornar a
capital da ‘justiça’ no Brasil.
A felicidade às vezes é boa, rica, cheia de intensidades
inesperadas e gratas surpresas. Mas, depois, porque os fatos se sucedem e, como
disse alguém, o sol é novo a cada dia, e a roda da fortuna, assim como a da
justiça, costuma dar voltas inesperadas. Por isso, a felicidade do juiz Sérgio
Moro, como a de qualquer outro mortal, não está garantida para sempre.
Um fato que pode perturbar essa felicidade é que o que ela
começou, outro jurista, Michel Temer, está terminando. Ao extinguir todas as
conquistas sociais, e garantias dos trabalhadores, destruindo as estruturas
mais firmes do estado brasileiro (a CLT, o SUS, a Previdência, o Salário
Mínimo, etc.), Temer produz uma guinada e gera muitos ódios.
É muito provável
que, como Cunha, Temer desapareça em breve.
Quando Temer desaparecer, quando o PMDB sumir na poeira, a
quem se culpará? Hoje a classe média já está com muita raiva. Amanhã seu ódio
crescerá na proporção do sentimento de ter caído numa cilada.
Ela se juntará a
alguns milhões de desempregados, de ex-membros da nova classe média D, e o que
sairá daí não se pode prever com exatidão. Mas, com muita probabilidade, os dedos
dessas hordas humanas enfurecidas e maltrapilhas estarão apontados para Sérgio
Moro. Ou melhor, para o anti-Lula.
Publicado em: Bajonas Teixeira
Fonte: http://www.ocafezinho.com/
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