ESTRATÉGIA EXPOSTA
Gravação mostra procuradores da “lava jato” tentando induzir
depoimento contra Lula
Por Marcos
de Vasconcellos , CONJUR
Ameaçar testemunhas com o intuito de influenciar o resultado
de uma investigação criminal configura crime de coação no curso do processo,
previsto no artigo 344 do Código Penal, já decidiu o Supremo Tribunal Federal.
No entanto, é difícil imaginar qual é o possível desfecho quando a atitude é do
próprio Ministério Público Federal.
Ameaças veladas, como “se o senhor disser isso, eu apresento
documentos, e aí vai ficar ruim pro senhor”, que poderiam estar em um filme
policial, foram feitas em plena operação “lava jato”. E em procedimento
informal, fora dos autos.
O cenário é uma casa humilde no interior de São Paulo.
Quatro procuradores batem à porta e, atendidos por familiares do morador — que
presta serviços de eletricista, pintor e jardinagem em casas e sítios—, começam
a questionar se ele trabalhou no sítio usado pelo ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e se conhece um dos donos do imóvel, o empresário
Jonas Suassuna.
Ao ouvirem que o homem não conhecia o empresário nem havia
trabalhado no local, começam o jogo de pressões
e ameaças:
Procurador: Quero deixar o senhor bem tranquilo, mas, por
exemplo, se a gente chamar o senhor oficialmente pra depor daqui a alguns dias,
e você chegar lá pra mim e falar uma coisa dessas…
Interrogado: Dessas… Sobre o quê?
Procurador: Sobre, por exemplo, o senhor já trabalhou no sítio Santa
Barbara?
Interrogado: Não trabalho.
Procurador: O senhor já conheceu o senhor Jonas Suassuna?
Interrogado: Nunca… Nunca vi.
Procurador: O senhor já fez algum pedido pra ele em algum lugar?
Interrogado: Nem conheço.
Procurador: Então, por exemplo, aí eu te apresento uma série de
documentações. Aí fica ruim pro senhor, entendeu?
A conversa foi gravada pelo filho do interrogado, um
trabalhador da região de Atibaia.
Os visitantes inesperados eram os procuradores
do Ministério Público Federal Athayde Ribeiro Costa, Roberson Henrique
Pozzobon, Januário Paludo e Júlio Noronha.
Nas duas gravações, obtidas pela ConJur, os membros do
MPF chegam na casa do “faz tudo” Edivaldo Pereira Vieira.
Sutilmente, tentam induzi-lo,
ultrapassando com desenvoltura a fronteira entre argumentação e intimidação,
dando a entender que dizer certas coisas é bom e dizer outras é ruim.
Na insistência de que o investigado dissesse o que os
procuradores esperavam ouvir, fazem outra ameaça velada a Vieira, de que ele
poderia ser convocado a depor e dizer a verdade.
Procurador: É a primeira vez, o senhor nos conheceu
agora, e eventualmente talvez a gente chame o senhor pra depor oficialmente,
tá? Aí, é, dependendo da circunstância nós vamos tomar o compromisso do senhor,
né, de dizer a verdade, aí o senhor que sabe…
Interrogado: A verdade?
Procurador: É.
Interrogado: Vou sim, vou sim.
Procurador: Se o senhor disser a verdade, sem, sem problema nenhum.
Interrogado: Nenhum. Isso é a verdade, tô falando pra vocês.
Procurador: Então seu Edivaldo, quero deixar o senhor bem tranquilo, mas, por
exemplo, se a gente chamar o senhor oficialmente pra depor daqui a alguns dias,
e você chegar lá pra mim e falar uma coisa dessas…
Investigado ou testemunha
Ao baterem à porta de Vieira, um dos procuradores diz:
“Ninguém aqui tá querendo te processar nem nada, não”.
No entanto, o nome de Pereira Vieira aparece na longa lista de acusados constantes do mandado de busca e apreensão da
24ª etapa da operação “lava jato”, que investiga se o ex-presidente Lula é o
dono de sítio em Atibaia, assinado pelo juiz Sergio Fernando Moro, da 13ª Vara
Federal de Curitiba.
Ao se despedirem, deixando seus nomes e o telefone escritos
a lápis numa folha de caderno, os membros do MPF insistem que o investigado
escondia algo e poderia “mudar de ideia”
e decidir falar:
Procurador: Se o senhor mudar de ideia e quiser
conversar com a gente, o senhor pode ligar pra gente?
Interrogado: Mudar de ideia? Ideia do quê?
Procurador: Se souber de algum fato.
Interrogado: Não…
Procurador: Se você resolver conversar com a gente você liga pra gente,
qualquer assunto?
Interrogado: Tá.
Ouça trechos da gravação:
Canal: Gilmar David
Santos
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