Segunda Turma do STF manda soltar ex-ministro José Dirceu
Três dos cinco magistrados da turma acolheram pedido da
defesa do petista. Condenado na Lava Jato, Dirceu está preso desde agosto de
2015 em Curitiba.
Por Renan Ramalho, G1, Brasília
02/05/2017 18h21 Atualizado há 3 horas
Por três votos a dois, a Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal (STF) mandou soltar nesta terça-feira (2) o ex-ministro-chefe da Casa
Civil José Dirceu. Condenado duas vezes na Operação Lava Jato, o petista está
preso em Curitiba desde
agosto de 2015.
Votaram a favor da soltura de Dirceu os ministros:
Dias Toffoli
Ricardo Lewandowski
Gilmar Mendes
Votaram contra:
Edson Fachin (relator da Lava Jato)
Celso de Mello
Com a decisão, a Segunda Turma acolheu o pedido de liberdade
apresentado pela defesa de Dirceu para revogar a ordem de prisão decretada pelo
juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira
instância da Justiça Federal.
Agora, o STF deverá enviar um mandado de soltura a Moro, a
quem cabe comunicar a decisão ao Complexo Médico Penal em Pinhais, onde o
ex-ministro está encarcerado.
Os ministros recomendaram a Moro que adote medidas
alternativas à prisão -- como monitoramento por tornozeleira eletrônica -- que
evitem risco de cometimento de novos crimes.
Caberá ao juiz definir tais medidas, que também podem
incluir proibição de contato com outros investigados e se apresentar
periodicamente à Justiça, por exemplo.
Em duas sentenças de Moro, Dirceu foi condenado a mais de 31
anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização
criminosa. Mas, antes disso, ele já estava cumprindo prisão preventiva (sem
prazo determinado), desde agosto de 2015, sob a alegação de que havia risco de
cometimento de novos crimes.
O entendimento do STF, no entanto, é que já não há risco de
cometimento de novos delitos e que, agora, a prisão só poderá ser efetivada se
Dirceu for condenado na segunda instância – no caso, em um julgamento do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que ainda não tem data para
acontecer.
Um pedido de liberdade antes do julgamento definitivo na
segunda instância já tinha sido negado pelo próprio TRF-4 e pelo Superior
Tribunal de Justiça (STJ). No ano passado, o ministro Teori Zavascki, que era
relator da Lava Jato no STF, também negou a soltura do ex-chefe da Casa Civil.
Voto do relator Edson Fachin
Sucessor de Teori na relatoria do caso no Supremo, o
ministro Edson Fachin disse que, ao votar contra a soltura do petista, estava
levando em conta a “gravidade concreta” dos crimes imputados a Dirceu e também
sua “reiteração delituosa”. Ele entendeu haver risco de cometimento de novos
crimes.
Fachin lembrou da ordem de prisão proferida por Sérgio Moro,
que enxergava “indícios de profissionalismo e habitualidade” na prática de
crimes pelo ex-ministro. Assim, a prisão seria necessária para “manutenção da
ordem pública”, de modo a evitar novos delitos.
Ele também chamou a atenção para o suposto pertencimento de
Dirceu a organização criminosa, o que segundo ele, é caracterizada por
“estabilidade e permanência”. “A envergadura lesiva dos delitos contra a
administração pública também admite a medida extrema”, afirmou o ministro,
falando da “gravidade do crime” de que é acusado Dirceu.
Fachin lembrou que o ex-ministro é suspeito de receber R$ 10
milhões da construtora Engevix em razão de contrato com a Petrobras. “O
montante não apenas impressiona. São cifras que sinalizam a gravidade concreta
das imputações. A imensa lucratividade fortalece em tese a necessidade de
medida cautelar”, disse o ministro.
Por fim, o ministro contestou o argumento da defesa de
“excesso de prazo” na prisão preventiva. Ele disse que a complexidade do caso
justifica a medida. “Estamos aqui nesse caso a tratar da singularidade do
colarinho branco”, afirmou.
Voto de Dias Toffoli
O primeiro a votar a favor da soltura de José Dirceu foi o
ministro Dias Toffoli. Em meio ao voto, o magistrado chamou a atenção para a
duração da prisão preventiva do ex-ministro – decretada antes da condenação –
que já dura 1 ano e 8 meses.
Toffoli argumentou que falta “atualidade” dos atos imputados
a Dirceu, lembrando que o último pagamento que recebeu ocorreu 1 ano antes de
sua prisão.
“Não há sequer a contemporaneidade, como o potencial
delitivo desse grupo não está mais no poder”, ponderou o magistrado.
O ministro também ressaltou a “presunção de inocência”,
observando que Dirceu ainda não foi condenado pela segunda instância, que pode,
inclusive, vir a absolvê-lo.
“Estamos a julgar a necessidade da prisão preventiva apenas
com decisão em primeira instância. O TRF-4 [segunda instância] já deu
provimento absolvendo réu que fora condenado pela 13ª Vara [de Sérgio Moro] que
permanecera preso por muitos anos, por muito tempo. Já se absolveu e não é um
caso único”, afirmou o ministro.
O ministro considerou que ainda existe risco na liberdade,
mas que, neste caso, pode ser mitigado pela aplicação de medidas cautelares,
como monitoramento eletrônico e recolhimento domiciliar, que poderiam ser
fixadas pelo juiz Sérgio Moro.
Voto de Ricardo Lewandowski
Segundo a votar pela soltura, Ricardo Lewandowski também
entendeu que medidas do tipo seriam “adequadas e suficientes” para garantir que
Dirceu não volte a delinquir, preservando assim, sua presunção de inocência.
“Não se pode atribuir ao paciente a demora em seu
julgamento, nem lhe negar o direito de defesa que a lei lhe assegura [...] A
verdade é que já se vão quase dois anos de prisão cautelar, sem que haja sequer
previsão de julgamento pelo TRF-4, não se podendo impor ao paciente que aguarde
preso indefinidamente pela decisão de segunda instância”, disse o ministro.
Ao final, o ministro sugeriu que o STF determine que o TRF-4
julgue com celeridade o recurso de Dirceu, para uma decisão em segunda
instância que permita a prisão ou a absolvição de Dirceu.
Voto de Celso de Mello
Único a acompanhar Fachin, Celso de Mello leu longo voto com
duras críticas ao esquema de corrupção montado na Petrobras e revelado pela
Operação Lava Jato.
Depois, rejeitou argumentos da defesa que alegaram fim da
coleta de provas e excesso de prazo na prisão.
“Não fosse a ação rigorosa, mas necessária do Poder
Judiciário, é provável que corrupção e lavagem estivessem perdurando até o
presente momento. Quer sejam violentos ou não, a prisão justifica-se para
interrompê-los, para proteger a sociedade de sua reiteração”, afirmou.
Ele ratificou entendimento do STJ que negou ao ex-ministro a
aplicação de medidas alternativas e chamou a atenção para o fato de que ele já
havia sido condenado no julgamento do mensalão.
Voto de Gilmar Mendes
Coube ao ministro Gilmar Mendes, presidente da Segunda
Turma, o voto decisivo para soltar Dirceu, quando o placar era de dois
ministros favoráveis à prisão e dois pela soltura.
O magistrado reconheceu a gravidade dos crimes investigados
na Lava Jato, mas advertiu para o possível erro de juízes ao cederem à pressão
popular, citando o jurista italiano Gabriel Zagrebelsky, critico à forma como
os judeus condenaram Jesus Cristo à morte.
“Não podemos nos ater, portanto, à aparente vilania dos
envolvidos para decidir acerca da prisão processual. E isso remete à própria
função da jurisdição em geral, da Suprema Corte em particular. A missão de um
tribunal como o Supremo é aplicar a Constituição, ainda que contra a opinião
majoritária”, disse Gilmar Mendes.
Assim como Toffoli e Lewandowski, Mendes recomendou que Moro
adote medidas alternativas à prisão, como monitoramento eletrônico.
Por fim, disse que, apesar de Moro ter “corretamente identificado”
risco de novos crimes, não há mais perigo atual na liberdade de Dirceu,
considerando que o grupo político a que pertence já deixou o poder.
Defesa
No pedido de liberdade, a defesa de José Dirceu negou a
acusação de que vários pagamentos efetuados por empreiteiras à empresa de
consultoria do ex-ministro fossem propina.
O criminalista Roberto Podval alegou aos ministros do STF
que, mesmo os pagamentos realizados após o julgamento do mensalão do PT, se
referiam a serviços de consultoria prestados anteriormente.
“Toda vez que saio daquela prisão gélida de Curitiba, me
pergunto: Qual a razão desse homem de 70 anos estar preso há aproximadamente 2
anos?”, enfatizou o defensor de Dirceu na tribuna da Segunda Turma.
Sobre a possibilidade de Dirceu atrapalhar as investigações,
Podval disse que a vida do ex-ministro já foi “devassada” e que a coleta de
provas nas ações que responde já foi encerrada. O criminalista destacou ainda
que quando o petista foi preso aguardou em casa sem apresentar qualquer risco
de fuga.
O advogado também rechaçou a acusação de que o ex-ministro
tenha voltado a delinquir após sua condenação no mensalão do PT, citando uma
decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que concedeu o perdão da pena
de Dirceu por ausência de falta grave.
“A prisão do José Dirceu, a condenação, o trânsito em
julgado na ação 470 [mensalão do PT] foi suficiente para cessar qualquer ato
criminoso que porventura possa ter ocorrido. A força política que poderia ter
José Dirceu enquanto o PT estava no poder é hoje inexistente.
Hoje é um homem
com mais de 70 anos absolutamente fora de qualquer nível de poder. Imaginar que
pudesse ter qualquer influência hoje, dada a atual conjuntura de poder, me
parece absolutamente impossível”, afirmou Podval.
Por fim, afirmou que a apresentação de uma nova denúncia
nesta terça pelo Ministério Público seja “talvez” uma tentativa de intimidar a
defesa e o próprio STF. Segundo o advogado, os procuradores já tinham as
informações sobre o caso há pelo menos 2 anos, mas decidiram apresentar a nova
acusação justamente na data de julgamento do habeas corpus.
“O poder do MP é tão grande que não se pode trabalhar com
essa irresponsabilidade. Não é ético, correto e leal”, disse Podval.
Acusação
Representando o Ministério Público, favorável à prisão, o
subprocurador-geral da República Edson Oliveira de Almeida lembrou da acusação
de que José Dirceu tinha ascendência política sobre o ex-diretor de Serviços da
Petrobras Renato Duque, citando diversos pagamentos de empreiteiras
supostamente beneficiadas em contratos com a diretoria.
“São 15 eventos desse tipo de 2009 a 2014, mostrando a
continuidade da corrupção”, afirmou. Ele argumentou que, mesmo com o
entendimento de que a prisão só seja possível após uma condenação em segunda
instância, Dirceu deve continuar na cadeia pela sua “periculosidade”.
“A presunção de inocência fica fragilizada pela sentença
condenatória e a prisão preventiva necessária pela periculosidade do paciente,
que continua durante e mesmo após a condenação no mensalão pelo STF. Ele
continua praticando [crimes] pela certeza de impunidade”, completou o
subprocurador.
Ele disse haver jurisprudência consolidada na Corte de que
não é razoável supor que baste uma condenação em primeira instância para fazer
cessar a prisão preventiva. “Tudo conduz à necessidade de manutenção dessa
prisão”, repetindo os riscos de uma eventual soltura.
MPF apresenta nova denúncia contra José Dirceu na Lava Jato
Nova denúncia
Os procuradores da República que atuam na força-tarefa da
Lava Jato em Curitiba afirmaram na manhã desta terça, em entrevista coletiva na
capital paranaense, que decidiram antecipar
a apresentação da nova denúncia contra Dirceu devido ao julgamento do habeas
corpus do petista.
Coordenador da força-tarefa, o procurador Deltan Dallagnol
disse aos jornalistas que a eventual liberdade do ex-ministro representaria um
"grande risco à sociedade".
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), Dirceu
recebeu R$ 2,4 milhões em propina antes, durante e depois do julgamento do
mensalão do PT (leia a íntegra da
denúncia).
Em entrevista coletiva concedida na capital paranaense para
apresentar a nova denúncia contra Dirceu, os procuradores da República
mostraram que os últimos depósitos de propina ocorreram depois da prisão de
Dirceu, ordenada
pelo Supremo por conta da condenação no julgamento do mensalão do PT, em
2013.
De acordo com o MPF, os pagamentos ao ex-ministro só
cessaram com a prisão do dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, em 2014. Um
dos delatores da Lava Jato, o empresário contou que Dirceu ofereceu ajuda para
inserir a empreiteira em países da América Latina e na Espanha porque tinha
acesso político à cúpula dos governos.
Ao final do julgamento desta terça n o Supremo, o ministro
Gilmar Mendes criticou o anúncio da nova denúncia do Ministério Público Federal
no Paraná no mesmo dia em que o STF julgaria o pedido de liberdade.
"Foi uma brincadeira quase juvenil. São jovens que
fazem esse tipo de brincadeira. Se nós cedêssemos a esse tipo de pressão, o
Supremo deixaria de ser Supremo. Não cabe a procurador da República pressionar
o STF, seja pela forma que quiser. É preciso respeitar as linhas básicas do
Estado de Direito.
Quando quebramos isso, estamos semeando um viés autoritário.
É preciso ter cuidado com esse tipo de prática", afirmou o ministro.
Fonte: http://g1.globo.com/
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