POLÍTICA
DIEGO ESCOSTEGUY
10/02/2017 - 19h32 - Atualizado 10/02/2017 20h27
O juiz federal Sergio Moro (Foto: Paulo Lopes/Futura
Press/Folhapress)
O juiz Sergio
Moro acaba de emparedar, silenciosamente, aqueles em Brasília que
fazem de tudo para soltar Eduardo
Cunha. Moro não negou
somente o habeas corpus impetrado pelos advogados de Cunha.
Juridicamente, essa decisão era esperada.
O juiz foi além. Aproveitou a
decisão, a mais relevante que tomou nos últimos meses, para fazer a defesa mais
enfática, desde o começo da Lava
Jato, sobre a necessidade das prisões preventivas.
E defendeu o uso das
prisões preventivas invocando, especialmente, as decisões de Teori
Zavascki que mantiveram Cunha na cadeia.
O nó estratégico de Moro atinge diretamente os ministros do
Supremo, que deverão julgar na próxima semana se soltam ou não Cunha.
O
nó: para revogar a prisão de Cunha, os ministros agora terão de, além de mudar
o entendimento do Tribunal para o assunto, ir contra decisões de Teori
exatamente contra o peemedebista.
Nesse cenário, votarão, perante a
opinião pública, contra um ministro cuja morte
comoveu o país e em favor de um político odiado por boa parte dela.
Eduardo Cunha, preso na Operação Lava Jato
(Foto: Paulo
Lisboa/Brazil Photo Press /
Agência O Globo)
Os argumentos de Moro:
• No caso de Cunha: nada mudou, e os fatos que embasaram a
preventiva (garantir a ordem pública, sobretudo) não só permanecem como foram
reforçados pela atuação belicosa do ex-deputado no processo.
Moro relembra que
a segunda instância manteve a prisão de Cunha, no que foi seguida pelo ministro
Félix Fischer, do STJ, e, no STF, por Teori – duas vezes. A frase que
enquadrou o STF: “O eminente ministro Teori Zavascki teve não uma, mas duas
oportunidades para cassar a prisão preventiva decretada por este juízo, e não o
fez”.
Moro disse ainda que “não trairá o legado” de Teori. Donde, quem revogar
a prisão fará exatamente isto: trair o legado de Teori.
• Nos demais casos rumorosos da Lava Jato, como o de Paulo
Roberto Costa e o de Marcelo Odebrecht: foram as preventivas que encerraram as “carreiras
criminais” dos investigados – sempre sob a égide de garantir a ordem
pública, entre outros fundamentos.
Ou seja, sem preventivas, não haveria
Lava Jato.
O trecho mais importante do despacho: “Em todos esses casos,
o desmantelamento da atividade criminal e a interrupção do ciclo delitivo,
protegendo outros indívidos, a sociedade brasileira e os cofres públicos de
novos crimes, só foi possível com a prisão preventiva e que teve suporte de
todas as instâncias do Poder Judiciário brasileiro.
Assim não fosse, é provável
que ainda estaria Paulo Roberto Costa recebendo propina e na posse de seus
ativos no exterior, quiçá deslocados para outro país, Alberto Youssef ainda
estaria lavando dinheiro de propina em contratos públicos e a entregando a
agentes políticos, e o Clube das Empreiteiras e o Departamento da Propina ainda
estariam em plena atividade” .
Os números que interessam:
• Há sete presos provisórios sem julgamento na Lava
Jato.
• Foram 79 prisões preventivas nos três anos de Operação.
Um número baixo, em
comparação com o trabalho cotidiano das varas criminais. E infinitamente
distante das cerca de 800 prisões da Operação Mãos Limpas, na Itália.
O que está por trás das críticas às prisões
preventivas, segundo Moro, é o “lamentável entendimento de que há pessoas acima
da lei”. Moro: “A questão real – e é necessário ser franco sobre isso – não é a
quantidade, mas a qualidade das prisões, mas propriamente a qualidade dos
presos provisórios.
O problema não são as setenta e nove prisões ou os
atualmente sete presos sem julgamento, mas sim que se tratam de presos
ilustres, por exemplo, um dirigente de empreiteira, um ex-ministro da Fazenda,
um ex-governador de estado, e, no presente caso, um ex-presidente da Câmara dos
Deputados”. O juiz leva o raciocínio à etapa seguinte.
“As críticas às prisões
preventivas refletem, no fundo, o lamentável entendimento de que há pessoas
acima da lei e que ainda vivemos em uma sociedade de castas, distante de nós a
igualdade republicana”, disse.
A reação de Moro ao que percebeu serem ameaças de Cunha: além
de manter a prisão do ex-deputado, comprometeu-se a redobrar o empenho. Foi
explícito e claro.
“Revogar a preventiva de Eduardo Cosentino da Cunha poderia
ser interpretada erroneamente como representando a capitulação deste Juízo a
alguma espécie de pressão política a qual teria sofrido em decorrência do
referido episódio”.
Quem tentou falar grosso com Moro até agora, como
Marcelo Odebrecht e Lula, deu-se mal. Cunha, ao que tudo indica, apostou na
estratégia errada.
O jeito Moro de dar um xeque até no presidente Michel Temer: o
juiz relembrou o caso das perguntas que Cunha queria fazer a Temer durante o
processo – e que haviam sido vetadas por Moro.
Eram, e qualquer um via
isso, um recado ameaçador de Cunha ao presidente. O próprio juiz observou agora
que “tais quesitos (perguntas), absolutamente estranhos ao objeto da ação
penal, tinham por motivo óbvio constranger o Exmo. Sr. Presidente da República
e provavelmente buscavam com isso provocar alguma espécie intervenção indevida
da parte dele em favor do preso”.
O subtexto é claro: Moro usou as armas de
Cunha contra Temer para alertar o presidente de que Curitiba está atenta à
possível articulação, em Brasília, para livrar o ex-deputado. O juiz escreveu
textualmente que Cunha tentou intimidar o presidente da República. Citar esse
episódio pode parecer uma defesa do presidente. É, na verdade, uma defesa da
Lava Jato.
O que está em jogo:
• A estabilidade do governo Temer. Quanto mais tempo
Cunha ficar preso, maior a chance de insistir numa delação premiada. Uma
delação dele, combinada à do operador Lúcio Funaro, parceiro de Cunha, teria
potencial para fulminar o primeiro escalão do governo.
• A estabilidade da Câmara. A delação de Cunha, a depender da extensão,
também atingiria deputados influentes.
• A estabilidade da Lava Jato. Se o Supremo ignorar o nó de Moro e
reverter o entendimento sobre as prisões preventivas, estejam os ministros
certos ou errados, a operação será manietada.
A contagem regressiva: Moro sentenciará Cunha até o fim
de março. Caso o ex-deputado não seja solto pelo STF e acabe condenado em
Curitiba, não restará a ele outra opção. É delação – ou cadeia por muitos,
muitos anos, talvez para a família dele também.
Fonte: http://globo.com/
Nenhum comentário:
Postar um comentário