Crise força o fim do injusto ensino superior gratuito
Os alunos de renda mais alta conseguem ocupar a maior parte
das vagas nos estabelecimentos públicos, enquanto aos pobres restam as
faculdades pagas
POR EDITORIAL
24/07/2016 0:00 / atualizado 24/07/2016 14:40
Numa abordagem mais ampla dos efeitos da maior crise fiscal
de que se tem notícia na história republicana do país, em qualquer discussão
sobre alternativas a lógica aconselha a que se busquem opções para financiar
serviços prestados pelo Estado. Considerando-se que a principal fórmula usada
desde o início da redemocratização, em 1985, para irrigar o Tesouro — a criação
e aumento de impostos — é uma via esgotada.
Mesmo quando a economia vier a se recuperar, será necessário
reformar o próprio Estado, diante da impossibilidade de se manter uma carga
tributária nos píncaros de mais de 35% do PIB, o índice mais elevado entre
economias emergentes, comparável ao de países desenvolvidos, em que os serviços
públicos são de boa qualidade. Ao contrário dos do Brasil.
Para combater uma crise nunca vista, necessita-se de ideias
nunca aplicadas. Neste sentido, por que não aproveitar para acabar com o ensino
superior gratuito, também um mecanismo de injustiça social? Pagará quem puder,
receberá bolsa quem não tiver condições para tal. Funciona assim, e bem, no
ensino privado. E em países avançados, com muito mais centros de excelência
universitária que o Brasil.
Tome-se a maior universidade nacional e mais bem colocada em
rankings internacionais, a de São Paulo, a USP — também um monumento à incúria
administrativa, nos últimos anos às voltas com crônica falta de dinheiro, mesmo
recebendo cerca de 5% do ICMS paulista, a maior arrecadação estadual do país.
Ao conjunto dos estabelecimentos de ensino superior público
do estado de São Paulo — além da USP, a Unicamp e a Unifesp — são destinados
9,5% do ICMS paulista. Se antes da crise econômica, a USP, por exemplo, já
tinha dificuldades para pagar as contas, com a retração das receitas
tributárias o quadro se degradou. A mesma dificuldade se abate sobre a Uerj, no
Rio de Janeiro, com o aperto no caixa fluminense.
Circula muito dinheiro no setor. Na USP, em que a folha de
salários ultrapassa todo o orçamento da universidade, há uma reserva, calculada
no final do ano passado em R$ 1, 3 bilhão. Mas já foi de R$ 3,61 bilhões. Está
em queda, para tapar rombos na instituição. Tende a zero.
O momento é oportuno para se debater a sério o ensino
superior público pago. Até porque é entre os mecanismos do Estado
concentradores de renda que está a universidade pública gratuita. Pois ela
favorece apenas os ricos, de melhor formação educacional, donos das primeiras
colocações nos vestibulares
Já o pobre, com formação educacional mais frágil, precisa
pagar a faculdade privada, onde o ensino, salvo exceções, é de mais baixa
qualidade. Assim, completa-se uma gritante injustiça social, nunca denunciada
por sindicatos de servidores e centros acadêmicos.
Levantamento feito pela “Folha de S.Paulo”, há dois anos,
constatou que 60% dos alunos da USP poderiam pagar mensalidades na faixa das
cobradas por estabelecimentos privados. Quanto aos estudantes de famílias de
renda baixa, receberiam bolsas.
Além de corrigir uma distorção social, a medida ajudaria a
equilibrar os orçamentos deficitários das universidades, e contribuiria para o
reequilíbrio das contas públicas.
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