Enviado por Rogerio Waldrigues Galindo, 25/07/16
10:58:48 AM
Chegou o dia: acabam de propor o fim da universidade
gratuita
UFPR: para O Globo, a própria existência da
universidade
pública é uma injustiça
O jornal O Globo sugeriu em editorial neste fim de
semana aquela que talvez seja a medida mais grave de desmonte do estado de
bem-estar social brasileiro – construído a duras penas durante as últimas
décadas. Em função da crise econômica, o jornal sugeriu que simplesmente se acabe com o ensino superior
gratuito. Assim: acabe-se, ponto.
A medida, de acordo com o editorial, serviria para duas
finalidades diferentes. A primeira, diminuir o peso da educação para o Estado
(a velha discussão sobre o gigantismo do Estado brasileiro e sobre a
necessidade de diminuir impostos). Por outro lado, dando um aspecto
“humanitário” à proposta, diz que isso acabaria com uma injustiça.
Leia mais: Sindicatos repudiam proposta
O argumento sobre a redução da carga tributária é mais
inteligível, até por estar sendo debatido o tempo todo. O outro, que tenta
vender como fim da injustiça aquilo que seria uma injustiça em si mesmo, é mais
curioso e menos comum. Segundo o jornal, o grande problema é que quem fica com
as vagas na universidade gratuita são os mais ricos. Os pobres são levados a
pagar ensino privado de qualidade muitas vezes duvidosa (é O Globo quem
diz, não eu).
A premissa do argumento tem uma certa verdade. Destinar as
vagas do ensino gratuito aos mais ricos é injusto. A solução é bizarra. Ao
invés de permitir que os mais pobres tenham acesso (mesmo que fosse em
detrimento dos ricos), jogue-se tudo fora. O bebê junto com a água do banho.
Décadas de investimento em uma educação pública de qualidade em função de um
sistema de seleção imperfeito.
Para O Globo, a solução seria o sistema inteiramente
privado, com bolsas para os mais pobres. Se essa fosse uma proposta séria, se o
argumento humanitário fosse realmente a razão, e não o aspecto econômico, não
faria sentido. Quem vai conseguir, dentre os pobres, as bolsas nas faculdades
privadas que restariam? Os que têm melhor desempenho, os mesmos que hoje entram
nas públicas gratuitas.
O argumento econômico também é frágil. Se a ideia fosse dar
bolsas (públicas?) vê-se que o custo poderia ser enorme. Seria para todos,
universal? Então o imposto seria ainda mais caro. Seria para poucos? Então
seria excludente, e não humanitário. Nesse segundo caso, os mais pobres
continuariam destinados a faculdades que o próprio jornal considera inferiores.
Ou seja, não se resolve problema algum.
O que está verdadeiramente em jogo é um projeto de país. O
desmonte de uma estrutura de inclusão que vem sendo posta em xeque nos últimos
anos em detrimento de um Estado menor e mais leve – e também mais desigual.
Nos últimos anos, vêm surgindo repetidamente ideias de que a
Previdência deve ser privada. De que o SUS deve diminuir. E de que o ensino
gratuito, agora, é injusto. Ao mesmo tempo, propostas que realmente aumentam o
atendimento aos brasileiros mais pobres, como o ProUni e o Pronatec geralmente
vistas com desconfiança.
É preciso chamar as coisas pelos seus nomes. O que a
proposta do fim do ensino superior público traz em si não é o fim de uma
injustiça. É a ideia de que a injustiça se dá de qualquer jeito e de que
devemos simplesmente deixar que ela ocorra sem pôr as mãos no nosso bolso para
ajudar quem fica de fora do sistema. É a meritocracia que protege o bolso
contra o assalto de quem nunca teve nada e quer ter chance de competir em
condições de igualdade.
Se há algo que luta contra a injustiça nesse país é o acesso
a uma educação de qualidade para todos. Se o Estado não servir para isso,
servirá apenas para muito pouco. Para muito menos do que precisamos.
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