Moro recua e decide não investigar mais blogueiro que vazou
notícia sobre Lula
Do UOL, em São Paulo
23/03/201713h56 > Atualizada 23/03/201717h38
Renato Costa/Estadão Conteúdo
Em despacho divulgado nesta quinta-feira (23), o
juiz da 13ª Vara Federal do Paraná, Sérgio Moro, recuou e decidiu não
investigar mais o blogueiro Eduardo Guimarães, que edita o Blog da Cidadania.
Guimarães divulgou informações sobre a condução coercitiva do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva em março do ano passado.
O blogueiro Eduardo Guimarães
foi alvo, na terça-feira, de um mandado de condução coercitiva (quando
se é levado a depor mesmo contra a vontade) determinado por Moro. Guimarães
prestou depoimento na Superintendência da Polícia Federal em São
Paulo. Moro também mandou apreender documentos, aparelhos e arquivos
eletrônicos do blogueiro.
Marcos Bezerra/Estadão Conteúdo
O blogueiro Eduardo Guimarães deixa a PF na terça, após
prestar
depoimento
Durante o depoimento, Guimarães, segundo Moro, confirmou que
à PF que alertou o Instituto Lula de que o ex-presidente seria conduzido
coercitivamente. Moro, em seu novo despacho, afirma que essa
informação era, em última instância, a motivação para a condução
coercitiva do blogueiro.
"O objetivo da investigação não era propriamente a de
identificar a fonte da informação do blog, já que ela já estava, em cognição
sumária, identificada desde o início, mas sim principalmente apurar se de fato
o seu titular havia comunicado a decisão aos investigados previamente à própria
divulgação no blog e à diligência de busca e apreensão", afirma o juiz em
nota.
Moro determinou a condução coercitiva do blogueiro na
tentativa de identificar quem era a fonte que teria passado para Guimarães a
informação sobre a ação que seria feita contra Lula.
A medida do juiz
responsável pela Java Jato em Curitiba foi
criticada por entidades que representam jornalistas, como a ONG Repórteres Sem
Fronteiras, que considerou o caso um grave atentado à liberdade de
imprensa.
De acordo com a Constituição, os jornalistas não são
obrigados a revelar suas fontes.
Na terça, a assessoria de imprensa da Justiça Federal
do Paraná havia divulgado uma nota para explicar a decisão de Moro. Na
justificativa, a assessoria informou que Guimarães "não é
jornalista", e, por isso, não teria o direito de ter resguardada a fonte
das informações que veiculou.
No despacho de hoje, Moro reavaliou a decisão.
Considerando o valor da imprensa livre em uma democracia e
não sendo a intenção deste julgador [...] colocar em risco essa liberdade e o
sigilo de fonte, é o caso de rever o posicionamento anterior e melhor delimitar
o objeto do processoSérgio Moro
No texto divulgado hoje, o juiz diz que a investigação
deve "prosseguir em relação às condutas de violação do sigilo
funcional pelo agente público envolvido" e reitera que a conduta do
blogueiro "não está, em princípio, protegida juridicamente pela liberdade
de imprensa".
Moro argumenta ainda que o fato de o blogueiro ter
respondido às questões durante depoimento indica que ele desconhecia seus
direitos como jornalista, não podendo, portanto, ser identificado como um
deles.
"Um verdadeiro jornalista não revelaria jamais sua fonte", diz
o juiz em nota.
"Deve ser excluído do processo e do resultado das
quebras de sigilo de dados, sigilo telemático e de busca e apreensão, isso
em endereços eletrônicos e nos endereços de Carlos Eduardo Cairo Guimarães,
qualquer elemento probatório relativo à identificação da fonte da
informação", afirma o juiz no despacho.
Juiz "reconheceu ilegalidade", avalia defesa de
blogueiro
Por meio de nota, o advogado do blogueiro, Fernando Hideo,
afirma que Moro "reconheceu a tese alegada pela defesa desde o início
dessa investigação, admitindo ter tomado medidas ilegais."
Por outro lado, a nota observa que, após o levantamento dos
autos, a defesa identificou um "fato extremamente grave": "Antes
de ser conduzido coercitivamente, o jornalista Eduardo Guimarães teve o sigilo
de suas ligações telefônicas violado.
O magistrado determinou que a operadora
de celular informasse seu extrato telefônico, com o objetivo claro de
identificar a fonte que teria passado a informação divulgada no blog. É importante
ressaltar que a fonte jornalística foi identificada mediante quebra de sigilo
dos extratos telefônicos do Eduardo Guimarães.
Portanto, a decisão não
corresponde à realidade ao afirmar que Eduardo 'revelou, de pronto, ao ser
indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria
a sua fonte de informação'."
"Está devidamente comprovado que, na ocasião do
depoimento, as autoridades já tinham conhecimento da sua fonte de informação,
obtido mediante o emprego de meios que o próprio magistrado agora assume serem
ilegais.
Não bastasse tamanha arbitrariedade, a autoridade policial sequer
aguardou a chegada deste advogado para iniciar o depoimento. Assim, é evidente
a ilegalidade deste depoimento, cuja anulação será oportunamente requerida pela
defesa, bem como a restituição de todos os equipamentos eletrônicos ilegalmente
apreendidos", complementa a nota.
Entenda o caso
A ação comandada por Moro apura o suposto vazamento de
informações da 24ª fase da Operação Lava Jato, iniciada em março de 2016, que
tinha como alvos o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua família e
assessores.
O blogueiro, que já havia chamado Moro de
"psicopata" em sua conta no Twitter, divulgou informações vazadas
sobre a condução coercitiva de Lula, que ocorreu em março.
O Ministério Público Federal disse na época que a divulgação
da informação teria prejudicado a operação.
A pedido de Moro, a Polícia Federal em São Paulo cumpriu
mandado de busca e apreensão e de condução coercitiva contra o blogueiro. Ele é
editor do "Blog da Cidadania", defensor de bandeiras da esquerda
e crítico ao presidente Michel Temer (PMDB), à Operação Lava Jato, que
acaba de completar três anos, e ao juiz federal Sérgio Moro.
Guimarães também concorreu à Câmara de Vereadores de São
Paulo, na eleição de 2016, pelo PCdoB --na chapa do então candidato à
reeleição, Fernando Haddad
Em março do ano passado, o ex-presidente Lula foi alvo de um
mandado de condução coercitiva na 24ª etapa da Operação Lava Jato, quando foi
levado para depor no aeroporto de Congonhas. Na mesma ocasião, o Instituto Lula
foi alvo de mandados de busca e apreensão.
Semanas antes, o Blog da Cidadania, de Eduardo
Guimarães, havia divulgado que o ex-presidente e seu Instituto seriam alvo da
Lava Jato. Diante disso, foi aberta uma investigação para apurar o vazamento de
dados sigilosos da operação.
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