Tensão entre Rússia e EUA é "hoje mais perigosa"
do que a Guerra Fria
10 DE OUTUBRO DE 201600:38
Ana Meireles
Vladimir Putin e Barack Obama encontaram-se pela última vez
a
5 de setembro, à margem da cimeira do G20, que se realizou em
Hangzhou, na
China | EPA/ALEXEI
DRUZHININ/SPUTNIK/
KREMLIN POOL
Moscovo põe mísseis no enclave de Kaliningrado para provocar
a NATO. Washington acusa Kremlin por ciberataque
"É uma falácia pensar que isto é como a Guerra Fria. Os
dias de hoje são diferentes e mais perigosos". O aviso foi feito no sábado
pelo ministro dos Negócios Estrangeiros alemão. Frank-Walter Steinmeier, em
declarações ao Bild, falava sobre a crescente tensão nas relações entre Estados
Unidos e Rússia - e que conheceram novos desenvolvimentos este fim de semana -,
citando as diferenças sobre a Ucrânia, a guerra cibernética e a Síria. "As
razões para o conflito entre Rússia e Estados Unidos estão a aumentar. Parece
que o remanescente da confiança mútua foi esgotado. Se isto continua, iremos
voltar aos tempos do confronto das duas superpotências", afirmou ainda o
chefe da diplomacia de Berlim.
O mais recente sinal desta crescente tensão entre Moscovo e
Washington foi dado ontem pelo ministro dos Negócios Estrangeiros russo.
"Estamos a testemunhar uma mudança fundamental de circunstâncias no que
diz respeito à agressiva russofobia que agora reside no centro da política dos
Estados Unidos em relação à Rússia", disse ontem Serguei Lavrov à
televisão estatal russa. "Não é apenas uma russofobia retórica, mas
medidas agressivas que realmente prejudicam os nossos interesses nacionais e
representam uma ameaça à nossa segurança", acrescentou.
O líder da diplomacia de Moscovo desfiou ainda uma lista de
queixas da Rússia contra os EUA que, disse, contribuíram para o ambiente de
desconfiança entre os dois países. Serguei Lavrov queixou-se de a NATO estar a
instalar infraestruturas militares para junto das fronteiras russas e atacou o
Ocidente pelas sanções por causa da Ucrânia.
O ministro disse ainda ter ouvido que alguns políticos em
Washington estavam a sugerir que Barack Obama poderia aprovar o bombardeamento
de bases aéreas militares do governo sírio para alojar aviões norte-americanos.
"Este é um jogo muito perigoso tendo em conta que a Rússia, estando na
Síria a convite do governo legítimo do país e tendo duas bases lá, ter sistemas
de defesa aérea para proteger os seus ativos", avisou Lavrov,
acrescentando esperar que o presidente norte-americano não aceite aquele
cenário.
No dia 4, a Rússia mobilizou uma bateria de mísseis
antiaéreos S-300 para a Síria, com o objetivo de defender a sua base naval no
porto de Tartus, no mar Mediterrâneo. Medida anunciada um dia depois de os
Estados Unidos terem suspendido a cooperação com a Rússia para tentar encontrar
uma solução para o conflito sírio.
A situação na Síria teve no sábado mais um revés, com
Moscovo a vetar no Conselho de Segurança da ONU uma resolução apresentada pela
França e que pretendia acabar com os bombardeamentos sobre a cidade de Aleppo.
Um texto alternativo apresentado pela Rússia - que apelava ao fim do conflito,
mas sem pedir especificamente o fim dos ataques em Aleppo - foi igualmente
chumbado. EUA apoiaram a proposta francesa e vetaram a russa.
Atos pouco amigáveis
A Rússia suspendeu no início do mês um tratado com os Estados Unidos sobre a reciclagem de
plutónio utilizado em armas nucleares, em resposta ao que Moscovo chamou de
"atos pouco amigáveis" de Washington. "O tratado foi acertado
quando as relações estavam normais, civilizadas, quando ninguém estava a tentar
interferir nos assuntos internos do outro. Esta é a mudança fundamental das
circunstâncias", explicou.
Outro sinal da mudança de atitude da Rússia é a
possibilidade dereativarem as suas bases militares em Cuba e no Vietname,
que serviram como pivôs do poder militar soviético durante a Guerra Fria e
desativadas no início do século. Possibilidade deixada em aberto pelo ministro
adjunto da Defesa, Nikolai Pankov, citado esta sexta-feira pelas agências de
notícias russas.
O que a Rússia já fez foi enviar mísseis Isklander, de
capacidade nuclear, para o enclave de Kaliningrado, que faz fronteira com a
Lituânia e a Polónia. No entanto, o Ministério da Defesa russo garante que
trata-se apenas de exercícios de rotina, mas que poderá ser também um gesto
para mostrar o desagrado da Rússia em relação à NATO.
Autorizado por altos funcionários
Os EUA, por seu turno, acusaram oficialmente a Rússia por ataques
informáticos recentes contra pessoas e instituições norte-americanas com o
objetivo de interferir nas presidenciais de 8 de novembro.
Num comunicado conjunto, divulgado na sexta-feira, o
Departamento de Segurança Interna e o diretor de todos os serviços secretos dos
Estados Unidos dizem ter a certeza de que "o governo russo dirigiu"
recentemente vários ataques informáticos e que "tendo em conta o alcance e
a sensibilidade", "só altos funcionários da Rússia poderiam ter
autorizado estas atividades".
Em julho, Hillary Clinton acusou a Rússia do ataque
informático ao Partido Democrata, que levou à divulgação de 20 mil emails pelo
WikiLeaks. "A Rússia nunca fez uma coisa dessas a nível estatal",
afirmou, na altura, Vladimir Putin.
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