quinta-feira, 10 de maio de 2018

Documento da CIA relata que cúpula do Governo militar brasileiro autorizou execuções


Documento da CIA relata que cúpula do Governo militar brasileiro autorizou execuções
Rodolfo Borges6 horas atrás  10/05/2018

Manifestação no Rio de Janeiro em 1968.
 © Fornecido por El Pais Brasil Manifestação no Rio de Janeiro em 1968.

"Assunto: 'Decisão do presidente brasileiro, Ernesto Geisel, de continuar com as execuções sumárias de subversivos perigosos, sob certas condições", 
diz um memorando de 11 de abril de 1974 enviado pelo diretor da CIA, a agência de inteligência norte-americana, para o então secretário de Estado Henry Kissinger. 

O documento, revelado pelo Bureau of Public Affairs do Departamento de Estado dos Estados Unidos, expõe que a cúpula do Governo militar brasileiro (1964-1985) sabia sobre as ações de exceção tomadas contra adversários do regime.

"Este é o documento secreto mais perturbador que já li em vinte anos de pesquisa", descreveu o pesquisador Matias Spektor, coordenador do Centro de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. 

Spektor chamou atenção nesta quinta-feira para relatos disponibilizados pelo Governo norte-americano. 

O relatório começa descrevendo encontro de 30 de março de 1974 entre o então presidente Ernesto Geisel, o general Milton Tavares de Souza e o general Confúcio Danton de Paula Avelino, 
"respectivamente o ex-chefe e o novo chefe do Centro de Inteligência do Exército (CIE)", na descrição do próprio relatório.

 "Também estava presente o general João Baptista Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI)" e futuro presidente do país.

Segundo Spektor, o relato foi tornado público em 2015 e faz parte da política regular de abertura de fonte primária do Departamento de Estado. 

O relatório registra que o general Milton foi quem mais falou na mencionada reunião.

 "Descreveu o trabalho do CIE contra a subversão interna durante a administração do ex-presidente Emílio Garrastazu Médici

Ele enfatizou que o Brasil não pode ignorar a ameaça subversiva e terrorista, e afirmou que métodos extralegais deveriam continuar a ser empregados contra subversivos perigosos", diz o documento antes de chegar em seu trecho mais dramático: 

"Nesse sentido, o general Milton relatou que cerca de 104 pessoas, nessa categoria, haviam sido executadas sumariamente pelo CIE durante o último ano, ou pouco mais de um ano. 

Figueiredo apoiou essa política e defendeu sua continuidade".

Slide 1 de 10: Feita no forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, imagem retrata o dia do golpe militar de 1964, em 1 de abril.
Feita no forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, imagem retrata o dia do golpe militar de 1964, em 1 de abril

Ainda segundo o relatório, que pode ser acessado pelo site do Departamento de Estado,  

"o presidente [Geisel], que comentou a seriedade e aspectos potencialmente prejudiciais dessa política, disse que queria refletir sobre o assunto durante o fim de semana, antes de tomar qualquer decisão sobre a sua continuidade". 

No dia 1º de abril, Geisel "informou ao general Figueiredo que a política deveria continuar, mas que extremo cuidado deveria ser tomado para assegurar que apenas subversivos perigosos fossem executados".

"O presidente e o general Figueiredo concordaram que, quando o CIE detivesse uma pessoa que poderia ser enquadrado nessa categoria, o chefe do CIE deveria consultar o general Figueiredo, cuja aprovação deveria ser dada antes que a pessoa fosse executada", 

segue o relatório, cuja última mensagem disponível diz que 

"o presidente e o general Figueiredo também concordaram que o CIE deve dedicar-se quase exclusivamente a combater a subversão interna, e que a atuação do CIE, em geral, deve ser coordenada pela general Figueiredo". 

Apesar de o sigilo do documento ter caído, dois parágrafos que somam no total 19 linhas foram mantidos em segredo.

Para Spektor, que topou com o registro enquanto pesquisava outros assuntos, o memorando é "prova do envolvimento do regime militar na política de execuções sumárias de inimigos do regime". 

Ela se soma a evidências já existentes, como a gravação revelada pelo jornalista Elio Gaspari em que Geisel dá luz verde para a repressão à guerrilha no Araguaia e o depoimento em que um general francês descreveu a uma historiadora a ocasião em que Figueiredo o levou para acompanhar uma sessão de tortura.

 Segundo o pesquisador, "o relato mostra a importância de as autoridades brasileiras também abrirem os seus arquivos".

Slide 2 de 10: De autor desconhecido, imagem é um dos registros da Coluna Prestes, em 1924. Movimento iniciado por tenentes que, em oposição ao Governo de Arthur Bernardes, percorreu cerca de 25 mil quilômetros em 12 Estados brasileiros.
De autor desconhecido, imagem é um dos registros da Coluna Prestes, em 1924. Movimento iniciado por tenentes que, em oposição ao Governo de Arthur Bernardes, percorreu cerca de 25 mil quilômetros em 12 Estados brasileiros



Slide 3 de 10: De autor desconhecido, imagem mostra repressão policial durante o chamado Comício das Reformas, em 1964, que apoiava uma série de medidas, como a reforma agrária, adotadas pelo então presidente João Goulart.
De autor desconhecido, imagem mostra repressão policial durante o chamado Comício das Reformas, em 1964, que apoiava uma série de medidas, como a reforma agrária, adotadas pelo então presidente João Goulart

Slide 4 de 10: A imagem, captada por fotógrafo desconhecido, mostra um incêndio em um quartel carioca, resultado da Insurreição Comunista, liderada por Luiz Carlos Prestes. Em 1935, a insurreição foi abafada em rapidamente por Getúlio Vargas, que em pouco tempo daria um golpe, instituindo o Estado Novo.
A imagem, captada por fotógrafo desconhecido, mostra um incêndio em um quartel carioca, resultado da Insurreição Comunista, liderada por Luiz Carlos Prestes. Em 1935, a insurreição foi abafada em rapidamente por Getúlio Vargas, que em pouco tempo daria um golpe, instituindo o Estado Novo

Slide 5 de 10: A Insurreição de Aragarças foi uma tentativa de golpe militar, por parte da Aeronáutica, em 1959, para depor o então presidente Juscelino Kubitschek. O trabalho do fotografo Campanella Neto, que ganhou o Prêmio Esso, foi fundamental para a repressão do movimento.
A Insurreição de Aragarças foi uma tentativa de golpe militar, por parte da Aeronáutica, em 1959, para depor o então presidente Juscelino Kubitschek. O trabalho do fotografo Campanella Neto, que ganhou o Prêmio Esso, foi fundamental para a repressão do movimento

Slide 6 de 10: De autor desconhecido, imagem mostra caminhões do jornal 'O Globo' sendo depredados no dia do suicídio de Getúlio Vargas, em 1954. Parte da população revoltada enxergava no veículo um agente contrário a Vargas.
De autor desconhecido, imagem mostra caminhões do jornal 'O Globo' sendo depredados no dia do suicídio de Getúlio Vargas, em 1954. Parte da população revoltada enxergava no veículo um agente contrário a Vargas

Slide 7 de 10: Simbólica da violência dos conflitos brasileiros, imagem mostra a degola de um revoltoso durante a Revolução Federalista, guerra que durou cerca de dois anos no Rio Grande do Sul, entre 1893 e 1895.
Simbólica da violência dos conflitos brasileiros, imagem mostra a degola de um revoltoso durante a Revolução Federalista, guerra que durou cerca de dois anos no Rio Grande do Sul, entre 1893 e 1895

Slide 8 de 10: De autor desconhecido, imagem mostra casa de classe média bombardeada durante a chamada Revolução de 1924, em São Paulo, uma das rebeliões de tenentes que antecedeu a criação da Coluna Prestes.
De autor desconhecido, imagem mostra casa de classe média bombardeada durante a chamada Revolução de 1924, em São Paulo, uma das rebeliões de tenentes que antecedeu a criação da Coluna Prestes

Slide 9 de 10: População de mulheres e crianças presas em Canudos, em 1897. O fotógrafo Flávio de Barros foi enviado pelo Governo Federal ao conflito para fotografar a vitória do exército, que dizimou a população local, deixando cerca de 20 mil mortos, entre oficiais e civis.
População de mulheres e crianças presas em Canudos, em 1897. O fotógrafo Flávio de Barros foi enviado pelo Governo Federal ao conflito para fotografar a vitória do exército, que dizimou a população local, deixando cerca de 20 mil mortos, entre oficiais e civis

Slide 10 de 10: Uma imagem de Maria Bonita, em 1936, companheira de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, líder do que ficou conhecido como banditismo cangaceiro no nordeste brasileiro.
Uma imagem de Maria Bonita, em 1936, companheira de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, líder do que ficou conhecido como banditismo cangaceiro no nordeste brasileiro


Vídeo: Marielle Franco humilha Siciliano, acusado de matá-la (Via Estadão)

Publicado em 8 de mai de 2018


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