Bolsonaro
Destrói O SUS, O Único Capaz De Enfrentar O Coronavírus
Celeste Silveira 2 de fevereiro de
2020
Em artigo
publicado esta semana, a professora titular da USP e coordenadora do doutorado
em Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública (FSP), Deisy
Ventura, fez um alerta sobre como a destruição de um sistema público de saúde,
como o SUS, pode ser perigoso em caso de epidemias como o coronavírus e outras
emergências.
Os planos de
saúde particulares não vão fazer nada e também não podem fazer nada contra a
entrada de vírus no Brasil.
Esses planos só serão acionados após você já estar
infectado.
A prevenção é responsabilidade de um sistema público bem organizado,
com profissionais bem pagos, valorizados e qualificados.
Como bem lembrou
postagem de Patricia Jaime, o combate depende de um trabalho de vigilância
sanitária e controle epidemiológico.
“Todas as manchetes sobre o coronavírus
que estão alarmando as populações mundo afora fariam melhor serviço se
semeassem o pânico quanto ao desmonte dos sistemas públicos de saúde e à
desvalorização da ciência”, afirmou Deisy Ventura. Veja artigo:
Coronavírus:
não existe segurança sem acesso universal à saúde
Por Deisy
Ventura
Organização
Mundial da Saúde (OMS) declarou quinta-feira, 30 de janeiro, que o coronavírus
é uma emergência internacional de saúde pública, com base no Regulamento
Sanitário Internacional vigente em 196 países desde 2007.
A declaração produz
efeitos positivos, como o de chamar a atenção dos governos para um tema de
saúde, incentivar o compartilhamento de informações, inclusive científicas, e
encorajar investimentos em pesquisa.
Mas também
pode produzir efeitos negativos como o pânico, a inversão de prioridades em
saúde pública e a profusão de notícias falsas.
Pode, sobretudo, criar a
equivocada impressão de que o coronavírus é atualmente a maior ameaça à saúde
pública mundial, quando ele é não mais do que a ponta de um descomunal iceberg.
O
coronavírus é a sexta emergência internacional declarada pela OMS. A primeira
foi a gripe A (H1N1), entre 2009 e 2010, propagada a partir do México.
A
segunda foi a expansão do poliovírus, sobretudo em regiões de conflitos
armados, declarada em 2014 e ainda em vigor.
A terceira e a quinta referem-se
ao vírus ebola, sendo declaradas, respectivamente, entre 2014 e 2015 na África
Ocidental; e em 2019 na República Democrática do Congo.
A quarta emergência
teve como epicentro o Brasil: foi a síndrome congênita do vírus zika, em 2016.
É difícil
comparar tais emergências porque suas causas e características são múltiplas e
complexas.
O traço comum entre elas é justamente o conceito de emergência de
saúde pública de importância internacional (sigla em inglês: PHEIC).
Segundo o
Regulamento Sanitário Internacional, a declaração de emergência não se deve ao
número de casos, à letalidade de uma doença ou mesmo ao desempenho dos países
que são seu epicentro.
O que motiva
tal declaração é o risco de propagação internacional da ameaça, além da
necessidade de coordenação intergovernamental da resposta.
Em outras
palavras, se cada Estado adotar medidas por conta própria, em uma escala que
pode ir da negligência ao exagero, sem levar em conta informações e recursos
compartilhados por centros de pesquisa, agências internacionais e outros
Estados, as possibilidades de controle da doença serão radicalmente diminuídas,
enquanto as de causar danos desnecessários serão muito aumentadas.
No plano das
relações internacionais, há um elemento decisivo na nova emergência: o de ter a
China como epicentro.
O surto de Síndrome Respiratória Aguda Grave (sigla em
inglês:
SARS), ocorrido em 2003, também na China, teve crucial importância na
história da saúde global.
A tomada de consciência sobre o impacto do
vertiginoso aumento do tráfego internacional de pessoas sobre a propagação
internacional das doenças contribuiu para desbloquear as negociações do
Regulamento Sanitário Internacional, que se arrastavam há anos.
A relevância
econômica e o regime político da China são complicadores que a OMS deverá gerir
com máxima cautela durante esta emergência.
Devem ser
igualmente objeto de cautela as liberdades fundamentais e a dignidade das
pessoas.
Segundo a Organização Mundial do Turismo, um bilhão e meio de viagens
internacionais ocorreram em 2019 para fins de turismo e negócios.
Comparado a
este dado, o número de migrantes internacionais é muito inferior, sendo
estimado em cerca de 300 milhões.
Mesmo o
número de pessoas refugiadas não supera estimativas de cerca de 40 milhões.
No
entanto, em geral são migrantes e refugiados, e não turistas ou executivos, os
alvos de represálias indevidas durante emergências sanitárias.
Com razão, a OMS
destaca em suas recomendações a importância de evitar a discriminação e o
estigma por conta da origem, pois o que garante a segurança de todos é que as
pessoas, em qualquer caso, sejam alvo de cuidado e respeito.
Por fim,
cabe abordar a possibilidade de chegada do coronavírus ao Brasil, lembrando que
só existe segurança sanitária verdadeira em sistemas capazes de cobrir a
totalidade do território com acesso universal à saúde.
A detecção de uma doença
não pode depender de recursos financeiros para pagar um atendimento, e ainda
menos a sua prevenção e o seu tratamento.
Este sistema
já existe no Brasil: é o Sistema Único de Saúde (SUS).
Apesar de seu
subfinanciamento crônico e incontáveis mazelas, o SUS revelou para o mundo a
Síndrome Congênita do Vírus Zika, graças aos notáveis profissionais de saúde
que atuam no sertão nordestino e aos centros de pesquisa que resistem aos
ataques brutais à ciência brasileira recentemente intensificados.
Todas as
manchetes sobre o coronavírus que estão alarmando as populações mundo afora
fariam melhor serviço se semeassem o pânico quanto ao desmonte dos sistemas
públicos de saúde e à desvalorização da ciência.
Estes sim são as grandes
ameaças à segurança da saúde global. (Do Jornal da USP)
Deisy
Ventura, professora titular, coordenadora do doutorado em Saúde Global e
Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP e presidente da
Associação Brasileira de Relações Internacionais (ABRI)
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