Liberação de emendas bate recorde com Temer
Foram mais de R$ 10 bilhões liberados a parlamentares em
2017
Governo diz que emendas estão previstasFátima Meira/Futura
Press/
Estadão Conteúdo – 18.12.2017
Em ano de delação do Grupo J&F e suspensão de duas
denúncias criminais contra o presidente Michel Temer, as emendas parlamentares
tiveram em 2017 o maior valor liberado dos últimos quatro anos.
Ao todo, foram
R$ 10,7 bilhões, um crescimento de 48% em relação ao ano anterior e 68% maior
do que o liberado em 2015, quando a execução
se tornou obrigatória.
As emendas parlamentares são indicações feitas por deputados
e senadores
de como o governo deve gastar parte dos recursos previstos
no Orçamento.
Os parlamentares costumam privilegiar seus redutos eleitorais.
Incluem desde dinheiro para obras de infraestrutura, como a construção de uma
ponte, até valores destinados a programas de saúde e educação.
Embora impositivas — o governo é obrigado a pagá-las —, a
prioridade dada a algumas emendas ainda é fruto de negociação política.
Por
isso, são usadas para barganhar apoio em votações importantes no Congresso.
Em dezembro, enquanto o governo ainda tentava votar a
reforma da Previdência, houve a maior liberação mensal de empenhos, com R$ 3,24
bilhões (30,1% do total).
A conta inclui as indicações feitas individualmente
por parlamentares e pelas bancadas estaduais e do Distrito Federal.
Os
descongestionamentos de recursos no fim do ano, motivados pela constatação de
que o rombo nas contas públicas seria menor do que o previsto, ajudaram a
acelerar o ritmo de liberações no mês.
Antes disso, os meses seguintes à divulgação da delação
premiada da J&F, que implicaram Temer, concentravam os maiores valores
liberados aos projetos dos parlamentares.
Foram R$ 2,02 bilhões em junho e mais
R$ 2,24 bilhões em julho.
Durante a votação da primeira denúncia baseada na delação,
no dia 2 de agosto, o então ministro da Secretaria de Governo, Antônio
Imbassahy (PSDB-BA), foi flagrado negociando a liberação de emendas com
deputados da base aliada.
"As emendas existem para serem executadas,
independentemente de serem oriundas de parlamentar da base ou da oposição.
Na
época das votações, a oposição sempre vem com essa cantilena, mas na verdade
esse trabalho deve ser permanente", afirmou o atual titular da pasta,
Carlos Marun (MDB-MS).
Saúde
Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo nas mais
de 7.000 emendas individuais que tiveram algum valor executado ao longo do ano
mostra que 93,5% do desembolsado pelo governo foi para a saúde, única área cuja
destinação é obrigatória por lei. Os dados são do Siop (Sistema Integrado de
Planejamento e Orçamento).
Do R$ 1,36 bilhão que foi para a saúde, quase a totalidade
(98%) serviu para apoio e manutenção de unidades em cidades indicadas por
parlamentares.
O deputado Domingos Neto (PSD-CE), por exemplo, direcionou R$
11,28 milhões para abastecer os Fundos Municipais de Saúde de 36 prefeituras no
interior do Ceará.
Sua emenda foi a de maior valor pago no ano.
A segunda área que mais teve emendas pagas foi agricultura,
com R$ 39 milhões.
A maior delas foi de outro governista, o deputado Valdir
Colatto (MDB-SC), que conseguiu a liberação de R$ 2,34 milhões para 21 cidades
de seu Estado — entre elas Cordilheira Alta, que recebeu R$ 341 mil para
comprar uma escavadeira hidráulica, e Vargem Bonita, que teve R$ 253 mil para
construir a Casa do Produtor, local que servirá para o comércio da produção agrícola.
Embora tenha sido o segundo órgão com o maior número de
emendas individuais empenhadas no Orçamento do ano passado, o Ministério das
Cidades não teve nenhuma delas pagas em 2017.
O mesmo ocorreu com Transportes,
Meio Ambiente e Transparência.
Quando uma emenda é empenhada, mas não paga, ela
fica na fila de pagamentos do ano seguinte, como restos a pagar.
Partidos
Na divisão por legendas, 72,8% das emendas empenhadas foram
indicadas por parlamentares da base.
O MDB foi o mais contemplado (R$ 1,032
bilhão).
Parlamentares do PT, que tem a segunda maior bancada na Câmara,
tiveram R$ 831 milhões.
Na comparação com o que foi efetivamente pago, porém, a
diferença é maior.
Foi R$ 1,13 bilhão para parlamentares da base (75,8%), ante
R$ 254,05 milhões (17,1%) para opositores.
Até show
Embora a maior parte do dinheiro tenha sido destinada à
saúde, a lista de emendas parlamentares pagas pelo governo em 2017 inclui de
show do cantor Wesley Safadão a campeonato de motocross no interior de Minas.
Do total de R$ 2,27 bilhões liberados, pelo menos R$ 5,73 milhões serviram para
quitar cachês de artistas.
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Em junho, por exemplo, o Ministério do Turismo repassou R$
1,2 milhão à prefeitura de Maracanaú, no Ceará, por indicação da deputada
Gorete Pereira
(PR-CE).
A emenda havia sido empenhada no mês anterior e serviu
para pagar a 13ª edição da Festa de São João da cidade.
O show de abertura
coube a Wesley Safadão, famoso por hits como "Aquele 1%" e "Ar
Condicionado no 15". Ele cobrou R$ 246 mil pela apresentação.
O valor enviado à prefeitura foi quase integralmente usado
para pagar cachês.
Além de Safadão, apresentaram-se as duplas sertanejas Bruno
& Marrone (cachê de R$ 250 mil), Victor & Léo (R$ 200 mil) e bandas
como Aviões do Forró (R$ 180 mil).
O repasse ocorreu em 7 de junho, antes da primeira denúncia
contra o presidente Michel Temer ser apresentada, mas após a revelação da
delação de executivos do Grupo J&F.
Gorete votou a favor de Temer nas duas
denúncias.
Ela nega relação da liberação do recurso com
o seu voto.
Ao todo, o governo pagou R$ 7,15 milhões para promoção e
marketing de municípios, ação na qual se enquadra o repasse para artistas.
Valor bem próximo do que foi destinado para universidades federais (R$ 7,38
milhões) e superior ao enviado para obras de infraestrutura hídrica
(R$ 2,58
milhões).
Festas
Ao todo, foram 55 artistas, em 20 cidades, com cachês que
variaram de R$ 30 mil aos R$ 250 mil de Bruno & Marrone.
Ao menos outras
sete prefeituras que receberam repasses via emendas usaram o dinheiro para
contratar atrações artísticas para festas juninas.
Em Sapiranga, no Rio Grande do Sul, porém, foram enviados R$
700 mil para financiar a 34.ª
Festa das Rosas.
O pagamento se deu por meio de
uma emenda do deputado federal Renato Molling (PP-RS), aliado de Temer e marido
da prefeita da cidade, Corinha Beatris Ornes Molling.
O evento teve shows de
Michel Teló (cachê de R$ 170 mil), Titãs (R$ 126 mil), Naiara Azevedo (R$ 160
mil), entre outros.
Mas as emendas não financiaram só saúde
e shows.
Uma emenda
parlamentar do deputado Tenente Lúcio (PSB-MG) garantiu R$ 250 mil para a
realização da 5.ª etapa do Campeonato Brasileiro de Motocross de Tupaciguara,
em Minas.
O convênio com o Ministério do Esporte que viabilizou o repasse foi
oficializado no dia 23 de outubro, dois dias antes de Tenente Lúcio dar seu
voto contra o andamento da segunda denúncia contra Temer, a exemplo do que já
havia feito em agosto.
A depender das emendas indicadas no Orçamento de 2018, o
pagamento de shows continua garantido para este ano.
Deputados e senadores
destinaram, ao todo, R$ 32,93 milhões para "promoção e marketing de
municípios no cenário nacional".
Ministério do Turismo
O pagamento de cachês de artistas está previsto como um dos
destinos possíveis de emendas parlamentares, desde que siga regras definidas
por meio de portaria do Ministério do Turismo.
Segundo a assessoria da pasta,
para receber, o artista precisa estar previamente cadastrado no ministério e
todos os eventos são fiscalizados.
A portaria prevê até a fiscalização in loco no caso de
eventos que recebam repasses superiores a R$ 300 mil ou que já tenham sido alvo
de denúncias de irregularidades.
O ministério também envia um funcionário ao
local em caso de solicitações dos órgãos de controle.
A deputada Gorete Pereira (PR-CE) disse que o financiamento
do São João de Maracanaú com emenda já se tornou "tradição".
"Maracanaú é considerado o segundo maior São João do Brasil. A cidade tem
260 mil eleitores.
A festa junta de 30 mil a 40 mil pessoas por show.
O que eu
boto [no São João] é tradição. Já é o sexto ano seguido", disse Gorete.
A assessoria do cantor Wesley Safadão informou que não se
manifesta sobre "assuntos políticos".
Os outros artistas que
participaram da festa não foram localizados.
Autor da emenda que custeou uma etapa do Campeonato
Brasileiro de Motocross em Tupaciguara, em Minas, o deputado Tenente Lúcio (PSB-MG)
afirmou que o repasse se deu por sua atuação na área do esporte.
O deputado
Renato Molling (PP-RS) foi procurado, mas não respondeu.
Fonte: http://r7.com/
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