quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Livro em louvor do Füehrer Sergio Moro encalha nas bancas e livrarias

sábado, 3 de dezembro de 2016
Livro em louvor do Füehrer Sergio Moro encalha nas bancas e livrarias
 
Jornalistas Livres
Liquidação por encalhe
Por LOR, cartunista e médico (ou vice-versa)

A voz estridente anunciava a última chamada para meu embarque quando deparei com o desconto na compra do livro sobre o juiz Sérgio Moro e estanquei imobilizado diante da oferta, naquela espécie de vertigem que acontece quando algo está prestes a se revelar para nós e vem emergindo com força das profundezas de nosso inconsciente. 

Parecia vir à tona uma onda de humor diante do óbvio ridículo da pechincha estampada sobre o nome do bastião valoroso e justiceiro implacável do moralismo atual (ou deveria dizer morolismo?), mas a graça perdeu parte de sua força antes de alcançar a superfície. 

É muito mais do que um fracasso de vendas, é a desgraça de um grande projeto! - Gritou de sua mesa o editor, exasperado entre faturas e planilhas porque a edição do livro que arrebentaria todos os recordes de vendas encalhara em todo o país, inclusive na capital paulistana. 

O gerente de promoções, encolhido num canto da sala debaixo de sua culpa tentava se justificar: todos os sinais indicavam que seria o maior sucesso uma obra laudatória ao grande paladino da justiça (ou deveria dizer do justiçamento?), cujas batalhas ajudaram a derrubar a presidente que assumira publicamente ser presidenta. 

É que tudo parecia se encaixar bem, continuou o gerente de vendas, porque a operação lava-jato, como o nome indicava, seria algo rápido, zás-trás e eficiente, derrubaria um dos partidos políticos que usavam a Petrobrás para se manter no poder, então a oposição assumiria, o juiz viraria herói e pau! - O livro venderia horrores. 

E por que sua estratégia deu errada? – gritou o editor, mais vermelho ainda em suas origens anglo-saxônicas da baixa Bavária, deixando propositalmente respingar saliva sobre a cara do pobre gerente de marketing que abriu tremulamente um painel mostrando a todos que algo saíra fora de controle, não era culpa dele, o fato era que a operação de investigação da corrupção na estatal deveria ter ficado restrita a um determinado grupo de políticos, mas a ambição dos jovens investigadores sob o comando do juiz de família de origem toscana (ou deveria dizer tucana?) extravasara os limites da opereta e atingiu a própria orquestra, atrapalhando as provas para sobrar apenas convicção. 

O carro em ladeira abaixo sem freios bateu na rampa do palácio, destruiu alambrados do congresso e respingou lama em supremas togas e começou o salve-se quem puder (ou deveria dizer o pudê?).

Então, a velha pilantragem de sempre começou sua jardinagem na plantação de notícias na mídia sobre anistias gerais, mas restritas, que retirava a seiva do juiz. 

No meio desse devorteio, o livro sobre o capitão do mato ficou pronto e a gente espalhou o mais rápido que deu, disse o gerente de distribuição, mas a turma das panelas verde e amarelas parou de ir para a rua e o prestígio do nosso herói começou a desmoronar (ou deveria dizer des-moro-nar?) e o preço de capa começou a ficar caro, ninguém mais quer comprar. 

O jeito é a liquidação para não ficar com o estoque na mão e a gente ter que vender para reciclagem, como papel picado. Bem, em último caso a gente pode vender o papel picado para a turma de vermelho que agora está ocupando as ruas, argumentou o gerente de reciclagem, para jogar do alto dos prédios da Paulista, explicou. 

O editor estava visivelmente frustrado diante dos caminhos pífios que tomara aquela edição destinada a um best-seller (ou deveria dizer mais vendido?), e informou que tendo em vista que a coisa não deu certo como previra, reduziria o tamanho de sua empresa dentro do espírito de cortes da proposta desse governo (ou deveria dizer desgoverno?). 

Nesse momento, o jovem publicitário Ganhais Santana, recém contratado pela editora, informou que havia recebido uma ligação de fonte idônea e forte no governo e todos na reunião fingiram não saber que se tratava de um ministro soteropolitano (ou deveria dizer caleropolitano?) sugerindo que todos os exemplares do Sérgio Moro existentes no país fossem adquiridos a preço de custo pela secretaria do ex-presidente interino, mas neste momento tive que correr para a sala de embarque pois meu avião estava fechando as portas e perdi o resto da conversa.




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